É claro que tinham intimidade. Mas ela ia com calma, preferindo trocar beijinhos doces durante caminhadas sobre as pilhas de folhas secas de
outono em vez de partidas de luta livre quase sem roupa no apertado banco
de trás do carro de Chad.
No aniversário de dois meses de namoro, Chad pediu que ela cabulasse
a aula de álgebra para encontrá-lo no vestiário masculino para uma comemoração secreta. A garota jamais havia feito algo do tipo, mas parecia uma
ousadia divertida e excitante. Embora nenhum dos dois ainda e tivesse dito
“Eu te amo”, ela sentia isso toda vez que Chad entrelaçava seus dedos aos
dela. Uma semana antes, depois de tomar suas primeiras três cervejas em
uma festa, ela quase deixou escapar. Mas decidiu guardar para uma ocasião
especial: o aniversário de dois meses.
Depois de olhar por trás dos ombros, a garota entrou de fininho no
vestiário masculino e foi na ponta dos pés até a última fileira de armários.
Chad a cumprimentou com um sorriso. Um pouco depois, antes mesmo
de dizerem “oi”, já estavam se beijando. Parecia que o uniforme escolar
dela tinha sido feito sob medida para um encontro apressado como aquele.
As mãos dele deslizavam por ela toda.
Todinha.
E pela primeira vez no relacionamento deles, ela não se preocupou
com o local que as mãos percorriam. Era romântico e sexy, e tudo dentro
dela estava derretendo. Chad era mais experiente nessas coisas, e ela finalmente permitiu-se curtir o momento.
Eles teriam ido até o fim se estivessem no quarto de Chad, ou até
mesmo em seu carro. Mas estavam no vestiário fedorento e o fim da aula
de ginástica estava se aproximando. E a cada passo ouvido, assobio ou até
mesmo um ruído animado que penetrava no ambiente, o perigo de ser
descoberta invadia a névoa de insensatez da garota.
— Não posso — disse subitamente. — Não aqui. Não agora.
Chad tentou convencê-la com palavras, com beijos. Mas agora ela não
estava mais se derretendo por dentro, pelo contrário. Afastou-se da boca de | Shiobhan Vivian |
Chad e disse que era melhor voltar para a aula.
O rapaz ficou muito desapontado — uma postura familiar em seus
últimos encontros, só que um pouco mais enfática dessa vez. Ele implorou
que ela ficasse. Afinal de contas, ela mal havia tocado nele e ele estava muito
excitado. Nada mais justo do que terminar o que haviam começado, certo?
Ela insistiu que tinha de voltar à aula de álgebra. Suavemente.
Desculpando-se. E quando percebeu como Chad continuava chateado,
inclinou-se para beijá-lo. Um beijinho na ponta do nariz, para deixar tudo bem.
Ela sentiu três palavras querendo sair de sua boca, prontas para serem ditas.
Mas Chad virou o rosto.
A garota se sentiu mal ao voltar apressada para a aula. Sentiu-se ainda
pior depois dela, quando viu alguns rapazes tirando sarro de Chad perto da
árvore dos fumantes. Ele foi para o carro sem nem mesmo acenar para ela
com a cabeça.
A garota não sabia que a inabilidade de Chad transar com uma caloura
tinha se tornado a piada do momento. Uma responsabilidade social. Até
mesmo o próprio Chad brincou sobre isso durante semanas, pensando
que seus amigos iam dar um tempo se ele participasse da brincadeira.
Então, ele reclamava por “ficar na mão” após levá-la de carro para casa,
ou imitava estar transando com a porta do armário, zombando da própria
frustração depois que a garota o abraçava de manhã ou enquanto estavam
no pátio. Coisas assim. Mas a participação de Chad apenas incentivava os
comentários dos demais. A provocação ficava cada vez menos engraçada e
cada vez mais pessoal.
Foi um dos amigos de Chad que sugeriu a pegação no vestiário. “Use o
aniversário”, disse o cara. “Não tem como dar errado”. Para Chad, todo mundo
na escola estaria com os olhos grudados no relógio durante a quinta aula.
Todos esperavam que ele fosse conseguir. E quando apareceu decepcionado,
inventou uma desculpa que o isentava totalmente de culpa.
Quando a garota chegou na escola no dia seguinte, os sussurros a
atingiam como flechas envenenadas em suas costas. Garotos que tinham | Não sou este tipo de garota |
sido gentis com ela em festas, veteranas que tinham acabado de aceitá-la
no grupo, agora pareciam distantes e reticentes. Até mesmo alguns de seus
próprios colegas, aqueles que ela havia ajudado a adentrar no exclusivo
mundo escolar superior, de súbito passaram a ignorá-la. Ela não conseguia
entender. Pelo menos não até ver Chad, que olhou na outra direção, enfatizando sua culpa, para que não tivesse de falar com ela.
Em seguida, por onde ela passava, todos começaram a fungar. Sempre
que ela ia para qualquer lugar, alguém fungava. Não parou para pensar no
assunto. O tempo frio estava no ápice. Mas a ação ficava se repetindo. Funga.
Funga. Funga. Onde quer que ela estivesse.
Ela só percebeu o que estava acontecendo na hora do almoço, quando
um dos amigos de Chad foi até o quadro branco e escreveu o nome dela ao
lado da entrada de iscas de peixe.
“Ela me deu nojo”, imaginava Chad dizendo. “Quase morri de rir, ela
fedia tanto.” Tão idiota. Tão impensado. Tão mentiroso. Mas foi a gota d’água.
Chega. Era o fim. Para ela era o fim.
A onda inicial de provocação foi diminuindo depois de alguns meses,
como qualquer outra frase ou slogan de efeito. Chad nunca se desculpou. Talvez tivesse limpado a consciência admitindo para alguém que tinha apenas
feito uma piada ridícula, mas ele não disse nada à garota. E outra pessoa passou a ser alvo das fofocas quando uma novata supostamente participou de um
swing
[1]
no chuveiro da casa de seus pais com dois colegas de classe de Chad.
Mas para a garota aquilo provocou mudanças. Em forma de andar, na
frequência com que levantava a mão na classe, no que ousava colocar em
seu prato no almoço. Ela nunca mais foi a mesma novamente. Não mesmo.
Era a isca de peixe.
É por isso que confiar em garotos era igual a beber e dirigir. Claro, alguns correm o risco. O fato de se tomar uma ou duas cervejas nunca parece
perigoso no começo.
1. N. do T.: Atividade sexual de que três pessoas participam.| Shiobhan Vivian |
Mas, para mim, era óbvio: por que alguém iria querer correr o risco?
Então, era isso. A orientação tinha de ser algo desse tipo. Tínhamos de
informar coisas úteis em vez das regras de manutenção de armário. Ouvir
uma história como essa era tão importante quanto saber seu tipo sanguí-
neo, ou se você é alérgico a picadas de insetos. Era o tipo de informação que
poderia salvar a vida de uma garota.